sexta-feira, 7 de novembro de 2008

A defesa do povo


Num passeio à terra dos meus antepassados, diante do dia bonito que estava fazendo, resolvi dar uma caminhada. Estacionei o fusca em frente à uma casa do agricultor Antônio Maurelle. Na volta, me deparei com a porta trancada e a chave na ignição. Seu Antônio providenciou uma faquinha salvadora, que acabei quebrando. Durante a conversa, ele lembrou de uma propaganda em versos do Armazém São José e foi em casa pegar uma coisa, e em seguida voltou com um papel envelhecido. Escreveu uma dedicatória no verso e pediu que entregasse ao meu pai, que depois me falou que havia comprado os versos de um andarilho.

Três Forquilhas ​​​​– "Guananazes", nome original da região, que em tupi-guarani significa "terra dos abacaxis", é um vale belíssimo. O nome em português é o mesmo do rio, que possui bifurcações que lembram forquilhas, e desemboca na Lagoa Itapeva. É o lugar do Rio Grande do Sul onde a Serra do Mar é mais próxima do litoral. E lá, também, existe um morro ​​​​– Chapéu ​​​​– que de cima dá pra ver o mar. Mas a forma dele lembra mais um seio!  

Transcrição do texto
original:

"A defeza do Povo

Grande Armazem S. José/ Que começou pequeninho/ La perto do caite/ Bem a beira do caminho
O Armazem S. José/ Que foi criado do nada/ Para o povo sem fé/ Ja foi causa de risada
Mas com a graça divina/ Ninguém diz mais o que é/ Modesta casa granfina/ Com o nome de S. José
O Armazem S. José/ Não tem orgulho consigo/ Trabalha na boa fé/ Granjeando bons amigos
Conforme eu atendo o pobre/ Atendo o rico tambem/ Tem-se lugar para todos/ Dentro do meu Armazem
O Armazem S. José/ Situado em Guananazes/ Atende na bôa fé/ Vos deseja bôa paz
Angelino Porfirio Marques/ Incançavel lutador/ Quase faliu de desfalque/ Mas vae sendo Vencedor
Faça vossa economia/ A começar do café/ Já raiou a luz do dia/ No armazem S. José
O armazem S. José/ Não vive de concorrença/ Vive como Deus quisé/ Vencendo com paciença
Pois Vencer com paciença/ É o dever do comercio/ Faço grande diferença/ O tal favôr que não peço
No Armazem S. José/ Tem o que é bom e novo/ Gira como Deus quisé/ Sendo defesa do povo
Grande estoque de ferragens/ Todo vindo do estrangeiro/ Grande numero de imagens/ Do meu Santo Padroeiro
Grande estoque de molhado/ Gêneros de se comer/ Grande estoque de Xarque/ Maes gordo não pode ser
Fazendas e miudesas/ Grande estoque de calçados/ Melhores côr de firmeza/ Finos tipos variados
O Armazem S. José/ Que não engana ninguem/ Ele tanto vende a vale/ Como a dinheiro tambem
O povo da Costa de Dentro/ Tres Forquilhas, Maquiné/ Só faz vosso sortimento/ No Armazem São José
O estoque do S. José/ Quasi todo de terceira/ Porém não vende segunda/ Pelo preço de primeira!...
O Armazem S. José/ Vossa casa protetora/ Fornece o pobre turmeiro/ Pelo preço da lavoura
Meu ilustre cavalheiro/ Posso mais lhe declarar/ Que me comprando a dinheiro/ O senhor vae se admirar
Comecei com garrafinhas/ E bicos de mamadeiras/ Dentro de uma casinha/ Quasi que sem comieira/ Porém hoje é maiorsinha/ Mais sortidas as prateleiras
O Armazem S. José/ Emocionalmente/ Se dirige à freguezia/ Muito respeitosamente
Minha ilustre freguesia/ Ilustre operariado/ Quem comprar no S. José/ Ficara abençoado
Se algum dia em minha casa/ Ofendi o meu freguez/ Ele que se chegue a mim/ Peço perdão outra vez
Sertamente que quem luta/ Com sério número de gente/ Sertos dias se apresenta/ Com gesto de descontente
O S. José que foi fraco/ Mas que hoje é mais folgado/ Agradece à freguesia/ Lhes fica muito obrigado
Pois aos meus bons amigos/ Fregueses deste armazem/ Ofereço meu abrigo/ E tudo que nele tem
Minha distinta freguezia/ Podeis me acreditar/ Que trabalho noite e dia/ Pra poder vos ajudar
O S. José vos deseja/ Votos de felicidade/ Peça tudo o que quisé/ Eu farei vossa vontade
Pois no ano Santo/ Ano da economia/ Vendo tudo baratinho/ Pra ajudar a freguesia
Pois meus ilustres fregueses/ Resarei para voceis/ Quem resa um para outro/ Será ajudado seis meis
Eu desejo a freguesia/ Paz e longa salvação/ Após amanhecer o dia/ Visitae o meu balcão."

João Rodrigues da Rosa, Autor
 ​​​​(escrito no início dos anos 50)


Balneário Bom Jesus, 1952 (na época, fazia parte do município de Torres-RS) ​​​​– Angelino Marques se despedia do segundo armazém, o "A Defeza do Povo". Mudava de profissão. De bolicheiro para "caixeiro-viajante", como era chamado o representante comercial. Daí, com a mulher e os filhos pequenos, mudou-se para Torres, e vinte anos depois, para a Capital. O pequeno "grande" detalhe da foto: o retrato do presidente Vargas (não poderia passar despercebido!)