UM GOLE E TANTO
Nicácio nasceu no campo e se criou trabalhando na estanciola dos pais. Cuidava dos bichos e da plantação. Já era taludo e ainda não conhecia nada mais que o brete até o bolicho.
Filho único, quando os pais morreram, tomou conta de tudo, solito. Aí aumentaram seus encargos e responsabilidades. Ainda bem que o capataz, o velho Quirino, era de confiança desde o tempo dos antigos patrões.
Nicácio só se preocupava com o trabalho, enquanto a vida ia passando a galope.
Mas naquela idade amadurecida, já beirando os quarenta, se deu conta de não conhecer nada além do que o limite curto daquele horizonte plano que enxergava todos os dias.
Foi então que decidiu viajar para conhecer outros lugares. O seu compadre Patrício, então, recomendou que fosse conhecer o mar, que era bom para a saúde "salgar as bolas". Além disso, o traje de banho das mulheres andava mais escasso do que dinheiro em bolso de defunto.
Pois o Nicácio se assanhou e escolheu a Praia de Albatroz porque simpatizou com o bicho.
Olhando aquele baita deserto de areia e aquele mundo de água ficou deslumbrado. E enveredou direto ao mar atropelando as ondas. Nisso foi derrubado e engoliu água.
Também o compadre não tinha avisado que era para entrar aos poucos no mar.
Meio engasgado, saiu testavilhando e querendo se endireitar. Mas embora assustado, não perdeu a linha e disse:
- Não te fresqueia, sanguinha de merda, que eu te bebo toda num gole só.
Luiz Alberto Ibarra
Causos de Fronteira - Martins livreiro - 1992
quinta-feira, 20 de setembro de 2007
Sanguinha de merda
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